Corneta do RW

O FUTEBOL E O RUGBY (por Marcos Miola)

30 anos de carreira – Associação dos Procuradores do Estado do Rio Grande  do Sul
* -Procurador do Estado do RS

O FUTEBOL E O RUGBY

Venho amadurecendo uma tese sobre a forma peculiar de pensar e propor o futebol no Rio Grande do Sul que passa pelo inegável fato de que um grande número de dirigentes, treinadores e jornalistas esportivos gaúchos, no íntimo e sem perceberem, não aceitaram e não aceitam a grande cisão que ocorreu em 1863 na Grã Bretanha no esporte praticado com bola – conhecido por football – nas escolas britânicas e por clubes formados por seus ex-alunos, cisão que veio a resultar em dois esportes diferentes: o football e o rugby.

Sucintamente, até 1863 cada escola britânica tinha suas regras próprias sobre a prática do cada vez mais popular football. No intuito de dar uma homogeneidade a estas regras os clubes se reuniram e acordaram em adotar as regras praticadas pela Universidade de Cambridge, nascendo, então, a Football Association e as regras básicas do que conhecemos hoje por futebol. Como algumas escolas optaram por seguir praticando o football pelas regras da escola de Rugby, houve a separação dos dois esportes: futebol e rúgbi.

Mas como esses fatos distantes no tempo e no espaço vieram a nos impactar no Rio Grande do Sul de forma tão marcante e peculiar?

Para responder é necessário compreendermos como se joga o rúgbi. Deixamos de lado a diferença mais marcante, ou seja, que no futebol a bola é basicamente impulsionada pelos pés, enquanto no rúgbi pelas mãos, nem tão pouco vamos nos deter na forma de pontuação: try, drop goal, conversão de penalidade e/ou de try. Vamos ficar com as regras que devem ter mais impactado o imaginário futebolístico sul-rio-grandense.

A primeira é a regra de que a bola só pode ser passada para o lado ou para trás, nunca para frente. Apenas o chute – na verdade um “chutão” – é permitido para a frente e os jogadores para tocarem a bola devem estar atrás da linha de chute. Ou seja, no rúgbi há muito passe lateral, para trás e chutes no mais das vezes aleatórios para desafogo da defesa. Outra regra impactante é a de que o jogador que está com a bola pode ser bloqueado, derrubado ou segurado pelo time adversário, “tackleado” como se diz, podendo o defensor usar as mãos – não os pés e pernas – para a ação de defesa. Então, mesmo para aqueles que não conhecem o rúgbi, pelo resumo das regras descrita, se nota que é um esporte que exige muita força física e também muita “correria” para ganhar terreno do adversário. Não por acaso há muitos jogadores pesados com grande força física, notadamente os pilares e mesmo os jogadores com característica de velocistas também precisam e ter muita força física. Na verdade, todos os jogadores de rúgbi, com raras exceções, são muito fortes fisicamente.

Desta singela descrição do rúgbi podemos vislumbrar muitas das características incensadas do futebol gaúcho: futebol “pegado”, muita força física, jogadores fortes e muitos, muitos passes laterais e para trás e a defendida “ligação direta” da defesa para o ataque.

Portanto, não há como não vislumbrar nos nossos reverenciados volantes “clássicos” e centroavantes “de área”, “laterais defensivos”, que esbanjam força física em detrimento da técnica futebolística, características dos jogadores de rúgbi.

Então, sem maiores divagações, parece evidente que uma parte dos nossos – gaúchos – torcedores, dirigentes e jornalistas esportivos têm gravado sem saber no seu DNA o amor, não ao futebol, mas ao rúgbi. Torcem, dirigem e comentam pelo esporte errado. São órfãos da divisão ocorrido no século XIX na Grã Bretanha.

E a única solução para nos livrarmos dessa maldição – sim, é uma maldição – que assombra o futebol gaúcho é o Grêmio e o Internacional criarem times de rúgbi para que esses fãs tenham um canal para poderem extravasar na sua plenitude esse amor pelo esporte bretão irmão do futebol.

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